I.
ouvindo a queda de granizo
como se este meu corpo
fosse uma velha árvore
II.
o temporal abate-se sobre a bananeira¹
e toda a noite ouço a chuva
cair no balde
III.
sozinho
na manhã nevada
mastigo salmão seco²
IV.
as pedras do rio ficaram à vista
e neste inverno glacial
até elas encolheram
V.
chega o vento gélido
e deita-se
com a criança abandonada
Matsuo Bashô (1644 - 1694)
(Tradução e adaptação de Joaquim M. Palma, in "O Eremita Viajante", Assírio & Alvim, 2016).
(1) Junto da cabana de Bashô esteve plantada uma bananeira. Foi graças a essa árvore, recebida de oferta, que Matsuo Kinsaku adoptou o pseudónimo que o celebraria ("Bashô" significa precisamente "bananeira"). Aquando do seu falecimento, junto do local de enterro repetiu-se o gesto.
(2) Este haiku foi escrito com a seguinte nota, que o antecede: «Os ricos comem carne, os ambiciosos comem raízes. Eu sou apenas pobre». Note-se, ainda, que existe um provérbio chinês que diz o seguinte: «Aquele que consegue mastigar raízes, consegue fazer tudo». É a tal dizer, nitidamente, que Bashô faz referência no seu haiku.
(Retrato de Bashô por Hokusai - finais do séc. XVIII)
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