segunda-feira, 29 de junho de 2015

CANÇÃO DO SOFRIMENTO



A minha força sacudia as montanhas,
a minha alma sombreava o mundo.
Mas mudaram os tempos,
já não galopa o meu cavalo baio.
Se já não galopa o meu cavalo baio
que posso eu fazer?
Ah, minha pobre Yu,
qual será o teu destino?



Xiang Yu (232 a.C. - 202 a.C.) (*)



(Tradução de António Graça de Abreu, in "Quinhentos Poemas Chineses" (Nova Vega, 2014)).





(*) Xiang Yu lutou contra Liu Bang pelo trono da dinastia Han. Comandante das tropas rebeldes, acabou derrotado e naturalmente condenado à morte. Antes da sua execução, porém, escreveu este poema dedicado à sua concubina Yu - que acabaria por ser executada juntamente com o seu amante.







quarta-feira, 10 de junho de 2015

Todos sabem que o belo é belo


Todos sabem que o belo é belo
porque há fealdade.
Todos sabem que o bem é virtuoso
porque há o mal.

Existir e não-existir produzem-se um ao outro.

O difícil e o fácil completam-se.
O longo está contido no curto, e o alto no baixo.
O instrumento e a voz atingem uma só harmonia.
O antes e o depois seguem-se um ao outro.

Por isso, o sábio age sem esforço

e ensina o não-falar,
trata das coisas sem as possuir,
e executa sem esperar elogios.
E, porque não se apega,
o que faz permanece para sempre.





Lao Tsé (séc. VI a.C. - ?) (*)






(Tradução de Joaquim Palma, in "Tao Te Ching", Editorial Presença (1º edição - Julho de 2010).







(*) Lao Tsé, o Velho Mestre, é das figuras mais emblemáticas e obscuras da China antiga. Diversas lendas criaram-se em torno de tal figura, das mais plausíveis às mais absurdas possíveis, ora divinizando-a ora pondo em causa a sua própria existência.

Fundador do pensamento Taoísta e contemporâneo de Confúcio, cuja doutrina rivalizou desde sempre com os mais básicos preceitos do Taoísmo. 
Num período inicial da sua vida foi responsável pelos arquivos históricos e conselheiro da corte imperial de Chou. 
Após a queda desse império, reza a lenda que terá abandonado a cidade rumo ao Tibete. Ao chegar à fronteira, o guarda, reconhecendo-o, terá pedido ao Velho Mestre que deixasse escrito um livro sobre o "verdadeiro caminho e a verdadeira sabedoria". Desse pedido nasceu o Tao Te Ching, uma das obras mais publicadas de sempre em todo o mundo, logo atrás da Bíblia. Escrito o livro, Lao Tsé retomou a direcção do sol poente. E não mais foi visto. 









(Lao Tsé)






quarta-feira, 3 de junho de 2015

PENSANDO NA MINHA CASA EM CHANG'AN


(enquanto viajava com o exército por nove dias)



Se ao menos pudesse subir a algum lugar,
mas vinho ninguém me envia.
O meu pobre e longínquo jardim de crisântemos
floresce agora junto dum campo de batalha.




Cen Shen (715 – 770) (*)


(Tradução do original por Bill Porter, em "Poems of the Masters, China's Classic Anthology of Tang and Sung Dynasty verse". Tradução da versão inglesa por Pedro Belo Clara).





(*) Cen Shen, também designado Cen Can, foi filho do governador de Jianzhou (hoje Hubei) durante o governo da dinastia Tang. Aos vinte anos mudou-se para a localidade que dá nome a este poema. Foi amigo íntimo de Li Bai, um dos maiores poetas deste período que lhe dedicou o poema "Tragam o vinho!". Inicialmente, os trabalhos de Shen versavam sobre paisagens. Mais tarde, o teor dos mesmos mudará radicalmente, tendo em conta as suas diversas experiências militares no extremo noroeste do Império: a dureza climática e os incansáveis combates em plena guerra civil - a revolta do General An Lushan, entenda-se, que Shen combateu, deu origem a um dos conflitos mais ferozes e devastadores da era em questão (de 755 a 763).